"Ouço teu silêncio e o transformo num sorriso."
Américo Novaes
Estava sentada na varanda com os olhos fechados enquanto as recordações povoavam seus pensamentos e invadiam seu coração!
Dali a poucos dias faria oitenta e quatro anos.
A vida lhe fora generosa, ainda conservava a mente sadia e ainda tinha gosto em cuidar do jardim.
Semeava dálias e prímulas enquanto pensava na vida. Como num filme, via os momentos felizes que vivera.
Com os cabelos presos por uma fivela de estrela, Passava alguns momentos em sua varanda, ora cuidando, ora apreciando seus vasos de flores.
Ainda conservava o pé de romã, o pé de cereja e os hibiscos de toda uma vida.
Gostava de ser acordada pelo canto dos bem-te-vis, ouvir o sino da igreja e,só assim levantava-se para fazer o café.
Era uma mulher alegre,sonhadora , curiosa, cheia de idéias, gostava de escrever poesias e histórias enquanto olhava o céu cheio de estrelas.
Sim, sempre fora apaixonada por estrelas. Costumava dizer que só elas sabiam entender o que ia em seu coração.
Tivera poucos amores,muitas alegrias e alguns dissabores, todavia nunca perdera a capacidade de sonhar.
Há trinta anos conhecera aquele que seria o grande amor de sua vida, fora apaixonando-se lentamente por ele à medida que ia descobrindo coisas em comum, pensamentos idênticos e suas almas pareciam se completar.
Ainda lembrava do rosto dele no primeiro encontro , ao vê-la no vestido de renda preta, deram-se as mãos e em silêncio caminharam, cada um sentindo o perfume do outro, cada um ouvindo o bater do coração do outro.
Seus mais belos poemas de amor foram inspirados por ele, jamais alguém tocara sua alma como ele tocou.
Sentia saudade das flores que ele trazia junto com sorrisos e beijos apaixonados, do café da manhã de mãos dadas, torradas com geléia, cerejas e beijos.
Com ele havia vivido os melhores anos de sua vida.Guardara cada cartão, cada bilhetinho,os brincos e o anel, os livros que ele lhe trazia vez ou outra, os CDs de música clássica, músicas francesas, fotografias , as bonequinhas japonesas que enfileiradas, enfeitavam a cômoda do quarto, mas sobretudo, guardava na memória e no coração as declarações de amor, os abraços e os momentos meigos que juntos viveram.
Quantos belos momentos viveram e quantos nunca foram vividos!
Há trinta anos pintara uma caixa de cor prata e salpicara estrelas na tampa para guardar essas recordações.Dentro dela , como num quebra-cabeças, pedaços de sua vida.
Fora feliz como talvez muitas pessoas nem imaginem, tivera o melhor dele, deixara seu nome gravado para sempre em seu coração.
Em silêncio, relia cada cartão, o coração transbordando de amor , as lágrimas desciam inevitáveis, acompanhadas de um sorriso que iluminava seu rosto.
Nana Pereira
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